sábado, 6 de abril de 2013

Poser

Eu estava por aqui ouvindo minha nova banda brasileira preferida, Mohandas. Em particular, a música "Saudade do Pará". Como definiu um dos integrantes, trata-se de um tipo de saudade de algo que não se viveu. De fato, todos os integrantes são cariocas da gema, de classe média e, aparentemente, sem nenhuma relação familiar mais direta com o Norte do Brasil.

Eu também não tenho qualquer relação mais direta com a cultura do Pará, e para ser sincero sempre achei bem bregas (ha!) as músicas de lá – mais do que não me identificar, me desidentifico com elas. Mas a música do Mohandas mudou isso, me fez enxergar um tipo de beleza poética que eu nunca tinha visto, porque ficava escondida por trás de uma nuvem de estranheza que me afastava daquilo. Mas agora que vejo, começo a gostar também das músicas realmente paraenses, aquelas mesmas estranhas. E é assim que me torno um poser de forró.

O mesmo acontece por aí com tribos de punks, etc., ou, para ficar no mesmo contexto, dos jovenzinhos sambistas da Zona Sul do Rio (dentre os quais eu parcialmente me incluo). Aponta-se comumente que esses jovens "não sabem o que é samba", nunca subiram num morro (dos antigos, porque muita gente não sabe, mas nos morros de hoje não se faz mais samba, se faz funk), nunca foram malandros duros e sem dinheiro mas que davam qualquer coisa por uma bunda rebolando ou uma dose de cachaça (uma imagem um tanto romantizada, porque eu também não faço ideia do que era ser um malandro). Mas há algo no samba que os inspira, que os leva até ele, algo que foi peneirado e mediado, por uma tradição que talvez tenha começado com a bossa nova (que fez um samba mais leve, com harmonias mais complicadas, mais fácil de difundir através de outras camadas e grupos sociais). Tom e Chico não eram exatamente meninos de morro, afinal. Mas assim, com pessoas vivendo entre dois mundos, houve mediação, houve uma ponte entre dois mundos, houve troca e inspiração através.

Houve a formação dos posers de samba, aqueles que nunca viveram nada parecido com a realidade da qual aquelas músicas emergiam, que no entanto se inspiravam por alguma coisa ali, que não necessariamente entendiam, mas que fazia algum sentido diferente quando projetado no outro mundo. E que cultivaram essa coisa, referindo-se às raízes mas fazendo algo muito diferente e, ao mesmo tempo, herdeiro, cultuante, reavivador daquilo que era de outro. Algo assim bem estranho, como o tango na Finlândia.

Num mundo cheio de incomensurabilidades, é reconfortante saber que a mediação é possível, que as pessoas, sendo posers, são capazes de criar.

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